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Epidemiologista Ethel Maciel e infectologista Luana Araújo destacam necessidade de manutenção dos cuidados e o permanente investimento na ciência para melhor preparo e enfrentamento de pandemias

Nós ainda estamos vivendo numa pandemia? Essa é a pergunta que muitas pessoas fazem, motivadas pelo avanço da vacinação, pela presente queda nos indicadores de casos, de internação e de óbitos, mas também por sinais que o governo tenta emitir, como o recente anúncio do fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), por parte do ministério da Saúde. O questionamento foi tema do debate virtual “A pandemia acabou? Onde estamos e quais os cuidados que devemos ter”, promovido na última quinta, 28, pelo centro SoU_Ciência.

Com a mediação de Soraya Smaili, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenadora do SoU_Ciência, as especialistas Ethel Maciel, epidemiologista, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e integrante do comitê científico do SoU_Ciência, e Luana Araújo, infectologista e especialista em Saúde Pública debateram sobre atual situação da crise sanitária, alertando para o fato de que a pandemia segue em curso e não deve ser considerada vencida, já que o vírus é dinâmico e o afrouxamento nos cuidados pode representar riscos de uma nova onda, com novas variantes.

“Por definição, a pandemia atinge todo o planeta. Ou seja, é um evento global de altíssimo impacto sistêmico. Existiu critérios para defini-la, assim como também deve haver critérios que definam o seu fim. E se o mundo ainda enfrenta uma crise sanitária, não podemos falar que ela acabou, o que desrespeitaria justamente os fatores que marcaram seu início”, disse Luana.

A infectologista também destacou não existir ‘canetada’ que encerre uma pandemia. “Trata-se de uma falha de compreensão de conceito epidemiológico e dissociação do contexto mundial”, relacionando a fala ao fim da ESPIN, e lembrou que “a pandemia é um processo de múltiplas faces, onde vai se modulando os procedimentos e resultados. Estamos vivendo um dos patamares da pandemia e a nossa resposta deve permanecer ativa, acompanhando esse tipo de evolução da pandemia”.

Na mesma linha de pensamento, Ethel realizou uma breve e rica apresentação, trazendo alguns critérios e conceitos epidemiológicos e operacionais que determinam o status pandêmico, como decretos, leis sanitárias e decisões do governo. A epidemiologista também citou algumas reflexões sobre o presente, apontando a transição que vivemos e as medidas práticas para o enfrentamento dessas e de outras pandemias.

“Ainda não há consenso no mundo de indicadores que definam um fim para a pandemia. Inclusive, o momento não deveria ser de extinguir decretos que diminuam o controle e a comunicação sobre a situação para a sociedade, de que ainda estamos vivendo a crise sanitária”, ressaltou Ethel, que seguiu: “estamos sempre reagindo ao vírus, ele segue mudando e nós seguimos nos adaptando. Aliás, nesse sentido, a ciência não é uma verdade absoluta, ela também se modifica a partir do conhecimento que vamos acumulando”.

Ainda é tempo de ação

Se ainda não se pode dizer que a pandemia chegou ao fim, o tempo ainda pede ação e vigilância.

Para Soraya Smaili, “é preciso atuar para mudar esse cenário e o debate promovido pelo SoU_Ciência traz justamente esse propósito, que é de ampliar a comunicação e a interação entre cientistas e sociedade, para que as ações sejam tomadas com base nas evidências levantadas pela ciência”.

Nesse sentido, Ethel ressaltou algumas ações para a sequência do enfrentamento à pandemia, como a incorporação de medicamentos já aprovados para o tratamento da covid por parte do SUS, o estabelecimento de protocolos de atendimento em todos os níveis de atenção e também a criação de campanhas efetivas para o avanço da vacinação, além da implantação de serviços multidisciplinares para o atendimento das sequelas da covid, entre outras. “Ou seja, não basta revogar um decreto, é preciso de um plano de transição, com a visão de que os recursos extraordinários devem ser ordinários. Precisamos de uma coordenação nacional e de um instituto que monitore as emergências em saúde pública. Por fim, precisamos fortalecer o SUS e, claro, investir em ciência. Sem esse investimento, não há soberania, não há forma de desenvolvimento de um país”.

Em sua fala final, Luana aproveitou para alertar mais uma vez sobre a manutenção dos cuidados necessários durante a pandemia, “como a permanência dos protocolos de higiene e a continuidade da vacinação, além do retorno do decreto de Emergência de Saúde Pública Nacional, que garanta agilidade nos procedimentos necessários que acompanhem uma eventual evolução do vírus, lembrando que problemas complexos demandam soluções complexas. Isso, além da conscientização de cada um para se proteger e proteger o próximo”.

Para além dos cuidados durante a pandemia ainda em curso, a live novamente reforçou a importância de os cientistas se comunicarem melhor e se conectarem com a sociedade, “sempre por meio dos levantamentos de dados e evidências científicas, como o SoU_Ciência se propõe a fazer desde o seu primeiro dia”, finalizou Soraya.