Lançamento do Acervo da Pandemia acontece no dia 12 de março, às 14h, na Unifesp
Você provavelmente sabe o que aconteceu durante a pandemia de covid-19 no Brasil, mas talvez não saiba o que está por trás das decisões que impactaram milhares de vidas. Conheça um acervo que revela documentos, declarações, entrevistas e demais evidências de um sistema de poder, formado por agentes públicos e privados, que atuaram durante a crise sanitária, impondo seus interesses econômicos e políticos, contribuindo para ampliar a tragédia que levou à morte centenas de milhares de brasileiros e brasileiras.
Necrossistema: o poder sobre a vida e a morte
O prefixo necro tem origem no grego nekros e significa morte. Um necrossistema é, portanto, formado por um conjunto de instituições e agentes que atuam de forma articulada para controlar a vida e a morte da população, estabelecendo e ampliando seu poder sobre corpos, comunidades e a sociedade. Estudos mostram que havia um sistema coordenado e articulado, que atuou para desinformar, manipular e expor desnecessariamente as pessoas ao vírus e ao risco de morte, durante a pandemia de covid-19 no Brasil, buscando aproveitar a grave crise para impor narrativas e condutas negacionistas.
Em diálogo com o conceito de necropolítica, proposto pelo historiador camaronês Achille Mbembe, o acervo do necrossistema traz a público um conjunto de registros contendo discursos e condutas negacionistas, disseminados no período de 2020 a 2022, contrários à ciência e à defesa da vida. Como apontam estudos do Cepedisa/USP e o Relatório da CPI da Pandemia (2021), juntamente com irregularidades, fraudes e desvios de recursos, os discursos e as condutas anticiência do governo Jair Bolsonaro e de sua rede de apoiadores contribuíram para a ocorrência de diversos crimes, inclusive contra a humanidade.
O Acervo da Pandemia
O acervo é um repositório digital gratuito e aberto ao público, disponibilizado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Estruturado na plataforma Tainacan, um software livre amplamente utilizado por museus, arquivos e bibliotecas, o acervo reúne um extenso conjunto de materiais que evidenciam condutas e discursos, por vezes autoincriminatórios, de agentes públicos e privados durante a pandemia.
A curadoria documental foi realizada coletivamente, envolvendo pesquisadores/as, estudantes, técnicos/as, professores/as e parceiros/as, com um rigoroso processo de organização, descrição, classificação e indexação. O material também passou por revisões individuais e coletivas, contemplando aspectos de conteúdo, jurídicos e de padronização.
O acervo está estruturado em 17 temas (tais como Uso de máscara, Contágio e Imunização de Rebanho, Tratamento Precoce, Lockdown e Impacto na Economia, Ética e Autonomia Médica, Caso Manaus, entre outros) e 16 categorias de agentes/atores envolvidos, totalizando aproximadamente 250 registros documentais em formatos de áudios, vídeos e textos. Todos os itens do acervo podem ser acessados em um site que permite a navegação pelos temas e pelos agentes/atores, além de oferecer um sistema de busca para acesso direto aos conteúdos.
Alguns itens do acervo contêm discursos ou condutas anticiência e, por essa razão, são identificados com um selo que alerta sobre a presença de desinformação ou de posicionamentos contrários às evidências científicas. Considerando o papel do acervo no combate à desinformação, esses itens também recebem uma seção intitulada “O que diz a ciência”, na qual são esclarecidas as informações falsas ou imprecisas, com base nas evidências científicas disponíveis no período em que o discurso ou a conduta ocorreu, além de contextualizar o fato ao consenso científico estabelecido desde então.
Mais do que um repositório, o Acervo da Pandemia é uma ferramenta fundamental para preservar a memória, combater a desinformação e fortalecer a luta por justiça e reparação. O projeto foi desenvolvido por pesquisadores e estudantes da Unifesp, da UFRJ e da Fiocruz, que integram o Centro de Estudos SoU_Ciência, e contou ainda com a colaboração dos grupos de mídia independente Medo e Delírio em Brasília e Camarote da República, além de entidades como a Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (AVICO Brasil) e o Centro de Pesquisas em Direito Sanitário da USP (Cepedisa/USP).
Pesquisa de opinião pública do Centro SoU_Ciência mostra o apoio da população à responsabilização dos crimes cometidos durante a pandemia
A maioria dos entrevistados apoia o julgamento e a condenação de eventuais crimes da pandemia:
Você acha que os eventuais crimes associados às mais de 700 mil mortes na pandemia devem ser julgados e condenados?
Com relação ao que deve ser feito sobre os crimes, a maioria dos entrevistados acha que deve ser criada uma Comissão da Verdade, as vítimas devem ser indenizadas, e que um tribunal para acelerar esses julgamentos deve ser criado, o que evidencia o apoio da população à luta por verdade e justiça.
O que você acha que deve ser feito sobre os crimes da pandemia?
O Mapa da Necropolítica
O site do acervo abriga também um produto complementar, criado a partir desse mesmo projeto de pesquisa. Trata-se de um mapa multimídia que retrata os agentes que atuaram contra a vida e a ciência. Em um “tabuleiro” que simboliza o negacionismo científico, esses agentes da necropolítica emergem em meio a uma atmosfera tenebrosa, em que a lua, com as espículas do SARS-CoV-2 (vírus causador da covid-19), ilumina uma “terra plana” devastada pelo obscurantismo.
Os links e QR Codes do mapa permitirão acessar materiais audiovisuais inéditos, compilados em parceria com o grupo de mídia independente Medo e Delírio em Brasília, que revelam falas e ações dos agentes da política da morte.
Esse acervo é um chamado para que tragédias como as da pandemia de covid-19 no Brasil nunca mais se repitam em nossa história. Memória, verdade, justiça e reparação são pilares fundamentais para garantir um futuro em que a vida prevaleça sobre a política da morte.
Participe do evento de lançamento, que acontecerá no dia 12 de março, a partir das 14h, no Anfiteatro Leitão da Cunha (Rua Botucatu, 740, Vila Clementino, São Paulo/SP). Inscrições no site da Unifesp. Transmissão ao vivo pelo canal do YouTube do SoU_Ciência. Escute o teaser do Acervo da Pandemia de Covid-19 completo!
Serviço:
Lançamento: Acervo da Pandemia de Covid-19
Data e horário: 12/03/2025, às 14h
Local: Anfiteatro Leitão da Cunha (Rua Botucatu, 740, Vila Clementino, São Paulo/SP)
Transmissão ao vivo pelo canal do YouTube do SoU_Ciência