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Durante o debate do SoU_Ciência, reitoras decidiram trabalho conjunto em prol de políticas públicas que facilitem o acesso de mais mulheres na ciência, nas universidades e em cargos de liderança em nosso país

Nesta quarta, 16, o Centro SoU_Ciência realizou debate virtual com reitoras de algumas universidades federais, dentro do conjunto de atividades que o centro está realizando ao longo deste mês especial da Mulher.

O debate virtual “A Gestão das Mulheres na Universidades” aconteceu pelo canal do centro no Youtube e foi acompanhada, ao vivo, por quase uma centena de mulheres e homens, pesquisadores e representantes de universidades de todo o país e também da Europa.

Com mediação da pesquisadora Soraya Smaili, professora da Unifesp e coordenadora do SoU_Ciência, as reitoras falaram sobre os desafios da mulher na gestão universitária, de como enfrentaram e ainda enfrentaram preconceitos dentro do próprio setor de educação e na sociedade. Durante o debate, elas também se mostraram confiantes, determinadas e felizes por estarem abrindo caminhos para outras mulheres na sociedade brasileira.  

Participam deste debate as reitoras Marcia Abrahão, da Universidade de Brasília (UnB); Sandra Goulart, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Lucia Pellanda, da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre. (UFCSPA); Claudia Marliéri, da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP); Isabela Andrade, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel); Ana Beatriz Oliveira, da Universidade Federal De São Carlos (UFSCar); Joana Guimarães, da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB); e Denise Pires de Camargo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Sobre os desafios de ser mulher e gestora de uma universidade federal hoje no Brasil, muitas questões acabaram sendo abordadas. Ana Beatriz Oliveira, da UFSCar, destacou o machismo como um problema enfrentado dentro das universidades. “A universidade é um recorte de nossa sociedade e o machismo se faz presente ainda, infelizmente. É uma luta diária ter o respeito dentro de vários espaços e esta questão de gênero é um dos maiores desafios que enfrentamos. Mas, acredito sim que é muito importante ocuparmos estes espaços e prepará-los para as próximas que virão”, comentou.

Claudia Marliéri, da UFOP, fez questão de ressaltar que as mulheres que conseguem acessar o mercado de trabalho e se destacam em suas funções, como as próprias reitoras das universidades, acabam enfrentando um processo violento de desqualificação intelectual e sanidade mental. “Além disso, muitas vezes tentam nos diminuir interrompendo nossas falas, como já mencionou aqui a Ana Beatriz. Mas estes desafios no fortalecem para que possamos fazer este enfrentamento de uma forma melhor e coletiva”, ressaltou.

Denise Pires de Camargo, da UFRJ, primeira mulher a assumir a reitoria da universidade, falou sobre as barreiras que as reitoras ainda enfrentam para colocar suas ideias dentro dos espaços. “Os cargos de maior destaque, historicamente, sempre foram delegados aos homens, não apenas dentro das universidades, mas também em cargos de gestão e públicos, mas estamos lutando e mudando este quadro, com muito trabalho e determinação. As mulheres podem sim assumir reitorias e se candidatar aos cargos que elas quiserem porque estamos rompendo este teto de vidro, porque merecemos, e continuaremos lutando com a voz cada vez mais alta”.

Isabela Andrade, da UFPel, disse ter se identificado nas falas das amigas reitoras em vários aspectos, mas principalmente nos relatos de tentativas de silenciamento dentro das universidades. “Aqui em Pelotas temos duas mulheres na gestão da universidade hoje, estamos reitora e vice-reitora, e temos dentro da universidade um grupo bastante diverso entre homens e mulheres; com mulheres ocupando cargos altos de gestão, mas por nomeação. Nos cargos de gestão eleitos, no entanto, o percentual ainda é de 25%, bem reduzido, e precisamos ampliá-los. Enfrentamos ainda questões bastante negativas, mas o que vejo hoje aqui é um apoio maior das mulheres, professoras, técnicas, estudantes, porque elas se identificam conosco como mulheres que conseguiram assumir cargos de liderança e conseguem exercer esta liderança. Isso tem sido muito importante e é representativo, porque mostra que todas nós podemos estar em qualquer espaço e a importância do impacto que isso pode causar em todas as demais meninas”.

Joana Guimarães, da UFSB, primeira mulher negra eleita para a reitoria de uma universidade federal, ressaltou a visão que muitos ainda têm dentro das universidades, de que as mulheres precisam ser doces, cuidadoras, e que as mulheres que são mais firmes em suas atitudes, falas e ações acabam não sendo tão bem entendidas em suas funções e cargos de gestão. “Além disso, é importante falar também que muitas mulheres da nossa área de educação, assim como tantas outras, continuam com esta visão de que sua primeira função é cuidar da família -  uma pressão cultural de nossa sociedade - , e que muitas delas ainda não se candidatam a cargos de gestão ou deixam suas carreiras de lado, por conta disso.  Esse é um trabalho muito importante que devemos trabalhar com nossas estudantes. Precisamos nos libertar deste peso que carregamos ao longo do tempo”, enfatizou.

Lucia Pellanda, da UFCSPA, disse sentir mais os feitos do machismo hoje ao ocupar um cargo de gestão. “Não sei se eu não me dava conta disso antes, mas hoje percebo muito isso nas relações dentro e fora da universidade. Aqui somos também reitora e vice-reitora e no Dia da Mulheres colocamos em nossas redes sociais da que temos 75% de mulheres na pós-graduação; 65% de docentes, 57% de técnicas e 68% de alunas na graduação. Além disso, nas 6 pró reitorias, 5 são mulheres. Por conta disso enfrentamos após a publicação brincadeiras do tipo – “Quando vão abrir cotas para homens?”. Só que durante 60 anos a universidade foi predominantemente masculina e ninguém nunca estranhou ou reclamou disso. Estamos vivendo um momento mesmo muito difícil para ser mulher, para ser reitora, para defender a educação, a saúde, a ciência, mas não vamos desistir e continuar lutando”, disse.

Desafios superados

Marcia Abrahão, da UnB, também primeira reitora da universidade, é geóloga e afirmou estar acostumada a “quebrar pedras” (uma brincadeira dos profissionais da área). Também disse que muitas vezes, como reitora, já foi vista como “dura demais”.  “Nossos desafios são enormes, já tive que levantar sim a voz para manter o controle de algumas situações, mas vejo que talvez nosso principal desafio seja representarmos outras mulheres e sermos exemplo para elas. Precisamos deixar legados para que essa situação não permaneça no Brasil e em nossa sociedade”, frisou.

Sandra Goulart, da UFMG, disse ser importante as comemorações do Mês da Mulher para destacar a importância de se trabalhar para pensar o papel das mulheres na nossa sociedade neste momento. “E fico muito feliz de estar aqui hoje neste debate porque é exatamente isso que estamos fazendo neste momento. Nós já avançamos muito, não tenho dúvidas, mais ainda estamos muito longe de onde precisamos e queremos estar. Todas nós que estamos hoje aqui furamos este teto de vidro, mas fico muito triste quando olho tantas que não conseguiram chegar, por mais que quisessem, e por mais que tentassem”.

Durante este bate-papo aberto, franco e descontraído, que durou mais de duas horas, as reitoras também discutiram a necessidade de união e de um trabalho conjunto em prol de políticas públicas que facilitem o acesso de mais mulheres na ciência, nas universidades e em cargos de liderança em nosso país.

Para quem não acompanhou o debate vale muito a pena conferi-lo na íntegra no canal do SoU_Ciência no Youtube.