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A redução de inscrições para o ENEM deste ano, mais um retrato do cenário atual da educação

Por Deise Lopes de Souza e Maria Angélica Minhoto

Temos visto reiteradamente na mídia a notícia sobre o baixo número de inscritos para o ENEM em 2021, acontecimento que prenuncia um futuro mais restrito e menos inclusivo para os(as) jovens brasileiros(as), principalmente para os estudantes do ensino médio público regular. Na pandemia, o fosso da já enorme desigualdade educacional no Brasil se exacerbou, em virtude das inúmeras dificuldades de acesso e permanência nas escolas, pela ausência de equipamentos de comunicação para todos, de acesso à internet e de apoio do poder público, gerando frequência irregular e aumento dos casos de evasão, potencializados inclusive pela necessidade do trabalho juvenil para suprir necessidades financeiras, em vista da crise econômica que se instalou no país, e pelo sofrimento e luto com a perda de familiares e amigos.

Na escola, o convívio entre os jovens é sempre muito mais estimulante para os estudos e a conversão das atividades para o modelo remoto, em geral feitas em pequenas telas de um celular compartilhado com outros membros da família, é muito desmotivadora, fazendo crescer a insegurança, a sensação de sobrecarga e de estar pouco preparado para as provas do ENEM. Os professores do ensino médio são os maiores incentivadores de seus estudantes para que realizem a prova e ampliem as possibilidades de uma vida futura melhor, mas a falta de contato presencial tem limitado esse estímulo desde o ano passado.

Ao todo, o exame recebeu neste ano pouco mais de 4 milhões de inscrições, das quais, somente 3,1 milhões foram confirmadas com o pagamento ou a isenção da taxa, registrando o menor número desde a edição de 2005. Considerando apenas as edições do Novo ENEM, a partir de 2009, o número de inscritos confirmados será, pela primeira vez, inferior a 5 milhões e se considerarmos que nem todos os inscritos participarão dos dois dias de prova, esse número tende a cair ainda mais.

Essa situação foi agravada pela recusa do governo federal em assegurar a isenção de taxa de inscrição (no valor de R$ 85,00) para os participantes que se abstiveram do exame em 2020 que, na época, contabilizaram cerca de 3 milhões de inscritos. Muitos jovens, e respectivas famílias, que estão atualmente desempregados e declararam carência para não pagar a taxa inscrição dependiam dessa isenção para conseguirem realizar a prova, que, talvez, represente a única possibilidade de acesso ao ensino superior, sobretudo às universidades públicas que são historicamente muito concorridas. O cenário atual deflagra a exclusão de uma considerável parcela da população da concorrência por vagas aos cursos de graduação em ambito público e privado, principalmente daqueles que são oriundos das camadas mais pobres da sociedade.

Se a redução do número de inscritos é muito preocupante para o futuro de toda a sociedade brasileira, inclusive prejudicial para as instituições públicas e privadas de ensino superior, que podem ficar com inúmeras vagas ociosas, já que o ENEM é necessário ao Sistema de Seleção Unificada (Sisu), ao ProUni e ao Fies, para o Ministério da Educação parece ter representado um alívio imediato, considerando os cortes orçamentários da pasta neste ano e o crescimento no volume de pagantes da taxa de inscrição e que, para 2021, foi superior em quase 400 mil inscritos em relação ao ano passado.

Em maio deste ano, o MEC havia enviado um ofício ao ministro da Economia, informando que a verba destinada ao ENEM 2021 seria insuficiente para aplicar a prova, já que pelas estimativas do Inep, o custo do exame seria aproximadamente de R$ 794 milhões, muito próximo ao montante total de seu orçamento, o que inviabilizaria o cumprimento de suas demais responsabilidades com as outras avaliações educacionais que realiza. Uma economia imediata aos cofres públicos que, como visto, resulta em perda geral para todos os brasileiros, a curto, médio e longo prazos.

Deise Lopes de Souza (Doutoranda do PPGE – Unifesp)

Maria Angélica Minhoto (Profa. Unifesp e pesquisadora SOU_CIENCIA)