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Este texto é uma versão adaptada e resumida do discurso proferido pela professora de História Contemporânea e Coordenadora da Comissão da Verdade da Unifesp, Ana Nemi, no dia 16 de abril de 2024, durante o evento organizado pelo Centro SoU_Ciência, com o tema: “Universidades e Institutos na Ditadura”, debate promovido por ocasião dos 60 anos do Golpe Militar. O vídeo com a fala integral pode ser acessado clicando aqui. 

 

Vou contar algumas histórias. Em primeiro lugar, gostaria de lembrar que havia uma movimentação de estudantes e professores progressistas na Escola Paulista de Medicina no final dos anos 1950 e início dos anos 1960. Essa movimentação significou a primeira gestão progressista do Centro Acadêmico, na figura do Antonio Carlos Madeira, que depois viria a compor a Ação Libertadora Nacional. Significou a tentativa de organização da primeira Universidade Federal de São Paulo, que foi proscrita pela ditadura em seu primeiro Ato Institucional. A experiência da Unifesp foi esquecida e se manteve como escola isolada, e nós contamos essa história no relatório da Comissão da Verdade.

É a história de um pequeno lugar, que incorporava lutas. É isso que quero reforçar. Isso de ser um pequeno lugar quer dizer muita coisa. 

Como era um lugar pequeno, era fácil se esconder ali. Era a maneira que os estudantes tinham de continuar discutindo aquilo que eles discutiram na 3ª Conferência Nacional de Saúde de 1963, com a sua lógica de desenvolvimento em saúde já pensando em determinantes sociais da saúde, que seriam retomados na 8ª Conferência de 1986, que propôs o SUS. 

Eu queria retomar uma ideia do Gramsci, que é a dos círculos concêntricos, para pensar em um movimento em que, a partir da governação federal, iam se criando mecanismos para entrar em instituições de menor tamanho, como era a EPM, e as grandes, como a USP, a Fiocruz, a UFMG. Esses círculos concêntricos faziam com que a repressão chegasse em todos os lugares, e cometesse absurdos.

Em 1964, o reitor da primeira Universidade Federal de São Paulo foi afastado com o argumento de que ele formava uma célula comunista, junto com a secretária, o procurador e mais dois professores, todos foram afastados. Essas pessoas todas eram progressistas. Mas o reitor, seguramente, não era comunista. A célula comunista que existia de verdade, estava na Psiquiatria, onde estava o Benedito Artur Sampaio, o Fábio Ancona Lopes, o Pacheco Ferraz, o Antonio Carlos Miranda, e outros, que fizeram trajetórias distintas durante a ditadura. 

São trajetórias que vão se articulando ali a um grande movimento de resistência que nos trouxe até aqui, e que nos permitiu resistir aos anos do governo Bolsonaro também.