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Um exemplo de sucesso, que mostra o papel da Educação Superior e das universidades no desenvolvimento da inovação e no fortalecimento da democracia

Por Gabriela de Brelàz e Karen Fernandez

O papel da Educação Superior e das universidades no desenvolvimento e no fortalecimento da democracia é reconhecido por praticamente todos os países que se destacam por seu alto padrão de desenvolvimento científico e tecnológico e também por serem democracias estáveis e consolidadas.

Não há nação que tenha alcançado alto nível de desenvolvimento e inovação sem investimentos maciços no Ensino Superior. E estes investimentos não devem se circunscrever ao financiamento da imprescindível função formativa e educativa da universidade, mas devem possibilitar e garantir o desenvolvimento de pesquisa no seu interior.

De modo geral, os “Innovation Studies” destacam o papel decisivo da universidade na formação de uma economia inovadora. Especificamente, a literatura relacionada aos “Sistemas Nacionais de Inovação” enfatiza o papel da universidade na criação, no desenvolvimento e na difusão de inovações. No entanto, talvez sua maior contribuição ao desenvolvimento de um país seja a formação de indivíduos e sua fundamental capacidade de repor constantemente este “estoque”. A universidade é um repositório de talentos nas mais diversas áreas do conhecimento, constituindo, portanto, o berço de um recurso estratégico da economia do conhecimento sem o qual nenhum projeto de desenvolvimento é viável.

Nesse sentido, dividimos aqui uma história real que merece ser contada, multiplicada e exportada. Jefferson Luís da Silva, Mariana Gomes, Maurício Doro e Vinícius Cássio são egressos(as) do curso de Relações Internacionais, e Jéssica Giani, do curso de Ciências Econômicas, da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios (EPPEN/UNIFESP), campus Osasco, aberto em 2011, ou seja, com apenas 10 anos de existência e funcionamento. Atualmente, esses(as) estudantes se encontram cursando pós-graduação em Economia e Desenvolvimento, Ciências Sociais, Políticas Públicas e Relações Internacionais em universidades renomadas como Unifesp, Unesp, Programa San Tiago Dantas PUC-SP/UNESP/UNICAMP, Erasmus Mundus Joint Master Degree in Global Development Policy (GLODEP) e London School of Economics.  

Hoje, são profissionais que fizeram seu percurso formativo na EPPEN/UNIFESP e desenvolveram, dentre outras competências, habilidade para elaborar projetos, pensamento crítico, capacidade analítica e estratégica para refletir e enfrentar problemas da realidade brasileira, de qualquer outro país e do sistema internacional. De forma colaborativa e cooperativa, esses talentos formularam o projeto Motirõ São Paulo: the Learning Network for Crisis Response, que está na etapa final do  GENEVA CHALLENGE 2021: The Challenges of Crisis Management” (DESAFIO GENEBRA 2021: Os Desafios da Gestão de Crises), desafio reconhecido internacionalmente, para estudantes de pós-graduação, realizado pelo Graduate Institute Geneva, Instituto de Estudos Avançados em Relações Internacionais e Desenvolvimento. O desafio tem o intuito de estimular a reflexão e a inovação sobre o desenvolvimento a partir de diversas perspectivas disciplinares e contextuais, e acontece desde 2014. 

O projeto Motirõ propõe uma Rede Paulista para Gestão de Crises, focada no empoderamento de lideranças comunitárias para monitorar, gerir, responder e disseminar informações sobre crises em nível local, inspirada no atual contexto da pandemia. O projeto sustenta-se na premissa de que a "resiliência e compreensão do nível da comunidade é um requisito para impedir que qualquer crise se torne mais ampla e profunda", e que a "cooperação é a melhor forma de alcançar soluções". Dessa forma, a iniciativa busca se estabelecer como "o primeiro e único fórum de aprendizagem voltado para o aprimoramento de mecanismos de resposta a crises, estruturado no formato de uma rede online voltada para o desenvolvimento de mecanismos bottom-up para enfrentar crises, por meio do empoderamento de líderes comunitários". 

Destacamos este projeto que concorreu junto a outros 173 do mundo todo. Foi selecionado em uma primeira etapa junto a outros 16 projetos e classificado como um dos 5 finalistas. O resultado final será conhecido em novembro, mas é a primeira vez que uma equipe brasileira chega até essa etapa final.

Este projeto e o seu reconhecimento internacional mostram que a ciência nas universidades é protagonizada por seus atores em todos os níveis e não apenas por seus docentes. Estudantes são fundamentais em um tripé composto por docentes, discentes e técnicos e são altamente capazes de produzir inovação social com impacto na sociedade e difundi-la para outros países, na chamada difusão de políticas públicas. Mais além, evidencia o papel e a importância dos métodos, da produção e do “fazer científico” das Ciências Humanas, especialmente em um momento de crise e de necessidade urgente de enfrentá-la.

Os efeitos da pandemia gerada pelo novo coronavírus demonstraram a importância da pesquisa científica sem a qual não haveria vacina. Contudo, se por um lado não é possível resolver a pandemia sem vacina, por outro, seu desenvolvimento e aquisição não são suficientes para colocar um fim aos problemas decorrentes da crise. É justamente neste ponto que se tornam claros o papel e a importância do conhecimento produzido nas Ciências Humanas. Esse saber é estratégico e imprescindível para qualquer projeto/plano/política que busque enfrentar os problemas que assolam a sociedade. Portanto, referimo-nos a saberes que se complementam e não que se contrapõem. A ciência (soft ou hard) deve ser priorizada por qualquer país que tenha em seu horizonte a capacidade de enfrentar crises e problemas e de se desenvolver de forma sustentável. A Universidade como lócus de produção de conhecimento e repositório de talentos é ator-chave.

A relevância de projetos como este mostra que os estudantes se formam e atuam em benefício DA sociedade e COM a sociedade. Fundamental, agora, encontrarmos mecanismos para avaliar este impacto. A cientometria, as patentes e o desenvolvimento tecnológico são importantes mecanismos de avaliação de impacto, mas, são limitados em avaliar o que a universidade pública e sócio referenciada, e por extensão, seus estudantes, fazem PELA sociedade. Esforços do SOU_Ciência e de outros grupos de pesquisa estão sendo investidos nesta questão.

Para docentes de uma universidade pública que preza pelo desenvolvimento científico, pelo respeito à diversidade, pela igualdade social, pela inclusão, pelo fortalecimento da democracia e por uma sociedade mais justa e sustentável, ver seus estudantes se formando e sendo capazes de gerar transformação social, além de serem reconhecidos internacionalmente por isso, traz a certeza de que resistiremos ao negacionismo da ciência e aos ataques sem trégua às universidade públicas. A clareza sobre a importância do seu papel e função, bem como de seus docentes e pesquisadores, nunca foi tão necessária como nestes tempos difíceis em que estamos vivendo.

[Gabriela de Brelàz, professora da Unifesp e SOU_CIÊNCIA]

[Karen Fernandez, professora da Unifesp]