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A história econômica das nações mostra que o apoio à inovação é o motor do desenvolvimento, o que vai de encontro aos minguados investimentos brasileiros na área

Por Renato Sérgio Balao Cordeiro

Nos últimos dias, a imprensa noticiou o registro do maior índice de desmatamento da última década no Brasil. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), 13.255 quilômetros quadrados de floresta amazônica foram derrubados. Este fato, que causou repercussão mundial por ocasião da 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-26), vem acompanhado de uma redução significativa da fiscalização ambiental. Há confrontos e invasões de reservas indígenas por grileiros, madeireiros e caçadores, ações nefastas dos garimpos ilegais que provocam contaminação dos rios com mercúrio. Os povos originários estão sendo acometidos de diversas doenças.

Além dos impactos ambientais, políticas equivocadas do Governo federal reduziram de maneira drástica o orçamento da ciência, tecnologia e inovação (CT&I).

A história econômica das nações mostra que o apoio à ciência e à inovação é o motor do desenvolvimento, garantindo riqueza, trabalho, protagonismo e bem-estar para a sociedade. De acordo com a Unesco, os investimentos em CT&I aumentam a cada ano no mundo. Os Estados Unidos estão destinando 2,84% do seu PIB, a Alemanha 3,09%, o Japão 3,26%, a Coreia do Sul 4,53% e Israel 4,95%. Segundo a revista Nature, estimulado pela competição com a China, o Governo americano pretende alocar 81 bilhões de dólares somente para a Fundação Nacional de Ciências nos próximos 5 anos (2022 a 2026). Haverá extraordinário impulso à ciência, com desenvolvimento de tecnologias limpas, biotecnologias e intensa automação. Resultados de investimentos inteligentes em CT&I na área privada, podem ser mensurados no desempenho da Pfizer, que, segundo o Valor Econômico, projeta uma receita de 82 bilhões de dólares para 2021, que serão obtidos principalmente com a venda de medicamentos como o viagra e a vacina de mRNA contra a covid-19. A empresa anuncia cerca de 10 bilhões de dólares em pesquisa para a nova geração de vacinas contra a covid-19.

Os dados da competição econômica provocada pelo rearranjo da geopolítica internacional vão de encontro aos “minguados” investimentos brasileiros: 1,26 % do PIB em CT&I. O relatório de ciência da Unesco salienta a quantidade de pesquisadores por milhão de habitantes. Enquanto o Brasil tem 888 pesquisadores, a Coreia do Sul tem 7.980, a Alemanha 5.212, o Japão 5331, os Estados Unidos 4.412, o Canadá 4.326. O quadro brasileiro se agrava com a ausência dos concursos públicos. Os valores das bolsas são insuficientes para a sobrevivência de nossos jovens pesquisadores: 1.500 reais para mestrado e 2.200 reais para doutorado. O corte de 655,4 milhões de reais que seriam alocados no Ministério de Ciência e Tecnologia e Inovações para editais de pesquisa do CNPq e bolsas de estudo causou indignação da comunidade cientifica, da Academia Brasileira de Ciências, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e sociedades cientificas.

A falta de recursos leva à desesperança dos estudantes. Testemunhamos uma perigosa diáspora, entregando para os países desenvolvidos nossos melhores cérebros e talentos.

Da 13ª colocação na produtividade internacional de artigos científicos em tempos passados, o Brasil migrou para a contramão da história. As verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e do CNPq foram contingenciadas. Universidades federais e alguns institutos de pesquisa encontram-se em estado de penúria.

O mundo assiste à quarta revolução industrial, com inteligência artificial, computação quântica e tecnologias limpas. Se essa marcha anti-ciência não for imediatamente interrompida, o futuro do Brasil será de eterna dependência econômica e tecnológica, carimbando no nosso DNA o papel de exportador de matérias-primas e importador de produtos manufaturados. Porém, com desmatamento desenfreado, qual país comprará produtos de terras devastadas?

Renato Sérgio Balao Cordeiro é pesquisador emérito da Fundação Oswaldo Cruz, membro titular da Academia Brasileira de Ciências e do Conselho da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), e membro da Coalizão Ciência e Sociedade

Artigo original veiculado em El País