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Nova coleção da Barbie homenageia mulheres no combate à Covid-19; saiba um pouco da história

Por Débora Foguel e Washington Douglas Nunes Lira

A boneca Barbie, lançada na Califórnia pela empresa Mattel, data de 1959. Amada e desejada por muitas meninas, foi, certamente, o brinquedo do sonho e desejo de várias gerações de meninas mundo afora. Desde 1970, a boneca despertou controvérsia: suas características físicas retratam um corpo feminino idealizado, de proporções quase irreais, e que impõe um padrão de beleza de mulher americana para meninas de todas as culturas. Mais ainda, ela contou com uma coleção de apetrechos como carros de luxo, casas, barcos e roupas refinadas que, igualmente, povoava o sonho das crianças, pobres e ricas. Já em 1961, para escapar da solidão, Barbie ganha um companheiro, o boneco Ken, também com características de “homem branco sarado”.

Curiosamente, a boneca modelo de beleza feminina branca nunca foi fabricada em solo americano! Caso contrário, se tornaria ainda mais cara sendo produzida em mercados onde a mão de obra é mais barata e muitas vezes explorada. Que belo exemplo de boneca que permitimos que invadisse o mundo da fantasia e da brincadeira de tantas meninas, e que sequer se materializou para tantas outras, que não a podiam adquirir... A boneca se tornou padrão de beleza a ser perseguido, o que, certamente, causou muita frustração e traumas em corpos de meninas com outras aparências e padrões. A empresa calcula que, a cada segundo, duas bonecas Barbies são vendidas no mundo! 

Muitas foram as coleções de Barbies lançadas ao longo dessas mais de seis décadas. Lembro-me de uma Barbie que, quando se apertava um botãozinho, ela falava: “I hate Math”, “I hate Math”!!!! Uma boa forma de dizer que a matemática não é o lugar de meninas! Que desserviço, que tristeza… Esperamos que esse “brinquedo” tenha sido descontinuado.

Dito isso, felizmente, acabamos de acompanhar o lançamento de mais uma nova coleção de bonecas Barbie. Essa nova coleção homenageia as cientistas e profissionais que estiveram na linha de frente e que contribuíram para o enfrentamento da Covid-19. São seis as novas bonecas e, dentre elas, está a nossa querida pesquisadora, a Dra Jacqueline G de Jesus. Vejam o perfil das novas Barbies:

Dra. Andrey Sue Cruz – médica branca que atuou nos EUA na linha de frente combatendo a discriminação racional no atendimento na pandemia.

Dra. Jaqueline Goes de Jesus – biomédica baiana, negra, que sequenciou o novo Coronavírus do primeiro paciente brasileiro em tempo recorde: 48 horas! A Dra. Jaqueline de JeSUS que traz o SUS no nome! Nossa medalha de ouro!

Dra. Kirby White – médica australiana que desenvolveu um avental hospitalar cirúrgico adequado para assistir os doentes com a Covid-19.

Profa. Sarah Gilbert – cientista britânica criadora da vacina da Astrazeneca que utiliza adenovírus. A Dra. Sarah fez o estádio de Wimbledon se levantar para aplaudi-la!

Dra. Chika Stacy Oriuwa – psiquiatra canadense negra que lutou contra o racismo sistêmico durante a pandemia e defende uma medicina mais inclusiva. Seus pais são nigerianos.

Dra. Amy D’Sullivan – enfermeira que cuidou do primeiro paciente com Covid-19 em Nova York.

A todas essas mulheres o SOU_CIÊNCIA rende suas homenagens. Não só a estas mulheres hoje transformadas em bonecas, mas a todas as mulheres que estiveram em todas as linhas de frente: nos laboratórios, nos hospitais, enfermarias, supermercados, comércio e até mesmo em suas casas cuidando do outro!

Entretanto, numa perspectiva crítica ao capitalismo selvagem, sabemos que essa linha de bonecas da Barbie que homenageia as cientistas finalmente numa perspectiva étnico racial, não chegará a uma criança negra ou indígena da periferia, pois, provavelmente, a boneca terá um preço alto, próprio dos produtos desenvolvidos pela Mattel.

Acreditamos que ainda há um longo caminho dentro da indústria dos brinquedos para que bonecas cientistas possam inspirar uma criança periférica a se tornar uma cientista, dada a distância social que há no Brasil e no mundo profundo e periférico de cicatrizes que ainda estão longe de se fecharem depois de séculos de exploração colonial e escravidão. As críticas à boneca Barbie sempre foram feitas por ativistas estadunidenses, como Denise Cruz (2016) pelo fato de que, conforme mencionado acima, a maioria das bonecas serem magras demais e brancas, reproduzindo um conceito de etnocentrismo que assombra as Américas desde 1492.

Hoje, a Mattel entra no jogo criado pelo próprio liberalismo e traz a inclusão étnico racial, mas pouco ainda pensamos sobre a superação de obstáculos socioeconômicos e culturais que estão atrelados à relação criança-boneca-sociedade-diversidade.

Referência Bibliográfica

CRUZ, Denise Ferreira da Costa. Algumas notas sobre bonecas para mulheres “negras” em Maputo. Estudos Feministas, Florianópolis, v. 3, n. 24, p. 929-940, dez. 2016. Disponível aqui.

(Débora Foguel, professora da UFRJ e pesquisadora SOU_CIÊNCIA) (Washington Douglas Nunes Lira, estudante da Unifesp e bolsista do SOU_CIÊNCIA)